Renoir
Cézanne
Como se sabe, Cézanne e Renoir foram pintores provenientes do impressionismo, que, após a fase de amadurecimento do pensamento de cada um deles, criaram seus próprios caminhos, fora dos dogmas radicais que caracterizavam aquele movimento. Apesar dos estilos diferentes, os dois artistas se admiravam e eram companheiros nas sessões de pintura que praticavam ao ar livre. A intenção de Cézanne era fazer com que a natureza, representada na obra, desse uma ideia de massas concretas e, como nessas paisagens, submetesse as representações humanas e coisas à esfera, ao cilindro e ao cone, isto é, a uma geometrização do mundo, criando valores diferentes, até então desconhecidos na história da arte, que alcançaram as bases do cubismo e seus precursores, Braque e Picasso, que o desenvolveram e o expandiram.
Renoir e Cézanne representaram visões próprias quando pintaram juntos o Monte de Santa Vitória, em L’Estaque. Renoir dissolvia tudo em manchas luminosas, enquanto Cézanne construía as rochas como uma pirâmide. É claramente visível a diferença dos enfoques deles: Cézanne cria uma solidez nas pinceladas e dá forma múltipla e paralela; Renoir, ainda influenciado pelo impressionismo, manchas leves, luminosas, e elas compartilham uma captação geral do tema.
O processo de Cézanne ao elaborar a obra, segundo depoimentos de contemporâneos, como Ambroise Vollard, marchand dos dois artistas, que por eles também foi retratado, era trabalhado em dezenas de sessões, como aconteceu no seu retrato, que ainda foi considerado inacabado pelo artista; sobre o Monte de Santa Vitória foram realizadas 30 pinturas a óleo e 45 aquarelas. Para concluir As Grandes Banhistas (2.10 x 2.51 m), considerada uma das suas obras-primas, custou-lhe 7 anos de trabalho (1898–1905). Vê-se nos movimentos das massas pictóricas dessa obra uma estrutura sólida, piramidal.
A obra de Renoir explode em sensualidade. Uma das melhores descrições do pintor foi feita pelo seu filho Jean Renoir, que lhe preparava o diluente para a pintura: disse que o pai diluía bastante a tinta e ia desenvolvendo as formas, sem nenhum desenho; era pintando e saindo o motivo, com a tinta fresca e expressiva. O gesto de um mestre.
"A luz na pintura de Palhano é tão vital quanto a fotossíntese no crescimento das plantas, daí por que se distancia de qualquer concepção acadêmica de mera iluminação do cenário. Essa luz invisível preexiste na tela, é embutida no seu cerne, como uma candeia fechada."
Francisco Brennand
Francisco Brennand
domingo, 10 de agosto de 2014
sábado, 2 de agosto de 2014
Adeus, Santander Cultural
Foi anunciado, através de carta da equipe do Santander Cultural, no início do ano passado, aos seus caros amigos, que o edifício que o abrigava iria passar por uma grande reforma, que envolveria a restauração completa de sua fachada e importante requalificação interna. Também foi informado que a casa seria reaberta em maio de 2014, já no ritmo e na emoção da Copa do Mundo. Até aí a comunidade cultural ainda vibrava por crer que o importante centro das artes visuais, após vinte anos de participação na cidade do Recife, com exposições e curadorias direcionadas a apresentar o melhor da arte pernambucana e do País, iria, finalmente, dar um passo fundamental para se consolidar no Estado.
O baque foi grande ao alcançarmos o futuro no prometido maio de 2014. Os artistas, tendo conhecimento de que o Santander iria fechar as portas, clamaram para que o banco mantivesse as instalações e os equipamentos para que a vida cultural na cidade continuasse. A alta cúpula do banco respondeu que considera o edifício muito limitado para as exposições e que iria usar o Museu do Estado de Pernambuco (Mepe) para investir na arte e na cultura, tendo já firmado um contrato de três anos com o Museu. O Santander tem o direito de investir o seu dinheiro da melhor forma que indicar a sua estratégia financeira. A nós cabe apenas lamentar o fechamento de uma das instituições mais vivas do Recife, que já fazia parte de nossa cultura, relacionando-se com muitas outras em âmbito nacional.
O seu coordenador, Carlos Trevi, tornou-se uma das pessoas mais próximas dos artistas pernambucanos, principalmente por realizar exposições significativas e dar uma dimensão real da arte do Estado e do Nordeste para o País. As mostras eram organizadas no padrão excelente de apresentação, de curadoria; os catálogos, com grande qualidade gráfica e textos didáticos, críticos e de elevado nível. Poderia citar várias delas como exemplo, mas uma das que, no meu ponto de vista, marcaram foi Zona tórrida – certa pintura do Nordeste, que trouxe uma visão da pintura que se desenvolveu na Região. Uma liderança que Trevi exercia com discrição e elegância, admirada por todos que conheceram a sua coordenadoria. Tornou-se, assim, também um cidadão pernambucano pelo seu trabalho e pela sua dignidade.
sexta-feira, 1 de agosto de 2014
Adversário político
Há uma tradição, no Brasil, de que o antagonista político deve ser completamente derrotado; se possível, mesmo que veladamente, nutrindo um desejo de morte física e, principalmente, de ideias do já considerado inimigo. Isso vem de longo tempo.
Aquele que diverge dos pensamentos de certas facções é um indivíduo que não deve sobreviver à política após embates de campanhas numa disputa eleitoral. Armam-se estratégias para induzir o povo a pensar que o oponente é detentor das piores qualidades como pretendente ao cargo eletivo. Por isso surgem, nesses períodos, calúnias e iniciativas precipitadas, abertura dos cofres públicos e todo tipo de guerra eleitoral. Tudo vale para conseguir o poder. Pouco se discute ideias e interesses coletivos; a centralização está simplesmente nessa fome de domínio. Quando o vitorioso é instalado na função, inicia uma etapa para desqualificar o antecessor. Nada de aproveitar as obras positivas anteriores: os projetos são abandonados, gerando prejuízos para o erário público. A ânsia é expor as mazelas do governo anterior para sobressair como herói, dizendo que veio para salvar a nação, o estado ou o município. A maioria pensa assim, com o olhar fora da realidade, esquecendo-se do essencial, que é a vontade do povo de sobreviver às dificuldades. Com isso entendemos que o respeito à pluralidade de ideias no País não é uma praxe. Quase sempre os políticos são obrigados a admitir a existência de outros grupos que não pensam da mesma forma, porque estamos numa democracia. E só se unem com outros partidos por interesses de poder. O governo de países que não aceitaram outras ideias está consolidado como um estado forte e predominante sobre a vontade da sociedade, levando-a a uma tragédia social, cultural, por perder a sua identidade e força.
E é em nome do povo que todos justificam estar no poder. Nenhum deles diz que conseguiu estar lá porque seu partido quis conquistar o máximo nem deixa transparecer que está com a ambição afiada. Dizem que estão ali por idealismo. Até os mais descarados na história contemporânea da política brasileira revestem-se com uma pele de cordeiro bem-adaptada para o momento, unindo-se com antigos desafetos, entre abraços e batidas nas costas, deixando a opinião pública revoltada com essas demonstrações de hipocrisia. O essencial é o povo se libertar das armadilhas do Estado para escolher melhor seus representantes
quarta-feira, 16 de julho de 2014
Crime coletivo
A experiência do pintor Francisco de Goya (1746-1828), a partir de uma doença que o deixou surdo, em 1792, mergulhando-o no silêncio, fazendo-o se comunicar apenas por sinais ou escrevendo, tornou a sua visão mais aguçada. Esse fato, para os biógrafos e estudiosos da sua obra, é considerado como uma alavanca para despertar-lhe a genialidade, induzindo-o a concentrar o olhar sobre o mundo e os sentimentos humanos. Foi com esse espírito que ele realizou obras assombrosas de imaginação e de concepção em pinturas, gravuras e desenhos. Uma das mais fortes interpretações da violência bélica constituiu a série de gravuras Desastres da guerra. Essas gravuras foram produtos de seu testemunho sobre a invasão das forças napoleônicas, descrevendo a violência e animalidade da guerra; a fome em Madri, no mesmo período; e a reação dos espanhóis na expulsão dos franceses do seu território. Cada uma dessas gravuras aborda um aspecto humano quando está sob a pressão de um conflito. Goya dá título genérico à série: Fatais consequências da guerra sangrenta na Espanha contra Bonaparte e outros caprichos impressionantes. Com a verve própria, descreve as decapitações, os fuzilamentos, os roubos, os enforcamentos, os estupros e todas as inconsequentes ações e reações das guerras. O interesse do artista foi demonstrar que dos dois lados a brutalidade não tinha pátria, o importante era evidenciar o ponto animalesco nas duas forças. Individualmente, as gravuras eram batizadas com títulos esclarecedores quanto à complexidade humana: E são feras, Bem feito para ti, Mãe infeliz!; entre outros, surge o título Populacho, como tentando ressaltar a sombria ação do povo nessas circunstâncias. E, com essa indução, poderíamos confirmar o dito romano Voz do povo, voz de Deus?
Hoje, nós temos o jornalismo para mostrar as guerras e a violência humana. No mês de maio, aconteceu uma das cenas de barbárie em nosso país. A vítima, Fabiane Maria de Jesus, inocente, foi espancada até a morte, resultado de uma calúnia multiplicada nas redes sociais. Fotografias e vídeos do ato violento contra Fabiane comoveram a sociedade. Uma mulher indefesa e a multidão insana a lhe esbofetear a face, a feri-la com todos os instrumentos. Ela, ali, representando todos os Cristos, os mártires, como símbolo de mais uma vítima da maldade humana. Não estamos em guerra nem em revolução; talvez em convulsão social...
quinta-feira, 1 de maio de 2014
Arte e concepção
No século XX, principalmente nas décadas a partir de 1950, iniciou-se a aceleração de invenções nos campos teórico e prático da arte, que é notável. Em todo o planeta, o pensamento artístico é colocado cada vez mais à frente das últimas novidades. Os movimentos são revividos com intensidade, e revoluções estéticas surgem num passe de mágica. Ainda sob a herança de Marcel Duchamp, a arte conceitual tomou uma dimensão irreversível, e, nos dias atuais, repetem-se concepções vividas por artistas nas décadas anteriores. A arte de agora também se revela como fonte de questionamentos sobre os fenômenos sociológicos. Passou da coisa plástica materializada para revelar abstrações do mundo real, tentando modificá-lo sob a ótica ideológica. O artista deixou de valorizar o ofício como o entendemos no âmbito das habilidades artesanais, sobrepujando-o pela ideia, por uma argumentação teórica. E se alimenta através de uma suposta ciência para valorizá-la como algo duradouro. Tudo está em função dessa ideia. A tecnologia, os materiais mais inusitados, as rupturas, mesmo com o que possa ser considerado belo, estão a serviço dos conceitos de uma visão temporal.
Os artistas do Renascimento italiano caminhavam no sentido oposto. Foram considerados artistas-artesãos. No estúdio, com o auxílio dos colaboradores aprendizes, produziam vários apetrechos da vida prática, como celas para cavalos, sinos, móveis, o que se poderia imaginar de coisas úteis para o cotidiano, em arquitetura, engenharia, fundição, ourivesaria e tantos outros conhecimentos da habilidade humana. Além, claro, da pintura, da escultura, do afresco, que se colocavam como a prima obra. Parece-nos, hoje, que aqueles artistas se apresentavam com um poder criativo que ultrapassava o homem comum, e é quase incompreensível para as nossas mentes atuais concebê-los capazes de realizar tantas façanhas. Pensar em artistas como Da Vinci, Michelangelo e Rafael Sanzio — citando apenas os exemplos mais evidentes do Renascimento italiano do século XV — é ver um mundo de obras que permaneceu e que é testemunho de uma elevada cultura que marcou a história da humanidade. Esses artistas receberam a formação nos ateliês dos mestres Andrea del Verrocchio (Da Vinci), Domenico Ghirlandaio (Michelangelo) e Pietro Perugino (Rafael Sanzio).
quarta-feira, 16 de abril de 2014
Petição aos santos
O cidadão encontra-se sob o domínio de um sistema que o oprime a cada dia. A começar pelo Imposto de Renda, que alcança quase 40% dos rendimentos. E aí começa o encadeamento com outros que encarecem o custo de vida. Nos municípios, são vários. Bem, mas estão dentro da lei, e é difícil consertar. Aqueles parlamentares que são eleitos com o fim de nos representar são os mesmos que criam a legislação e protegem governos. Ou se submetem a decretos acionados pelo Executivo. Não me refiro apenas aos impostos, mas também à máquina do sistema, que engloba empresas estatais ou privadas que prestam serviços, como os bancos, companhias de água, de luz, telefonia, saúde, etc. Um dos maiores empecilhos é a comunicação dessas empresas. Quem tem a experiência de ligar fica preso ao telefone ouvindo músicas inconvenientes à espera de uma solução para resolver o necessário. A saúde está abandonada, com os pacientes nos corredores dos hospitais. A Justiça age com passos lentos... Parece-nos uma força além do cidadão comum, por tantas tiranias do sistema. Há muito tempo, os governos prometem um paraíso... Mas estes são liderados por chefes que venderam ilusões e retrocederam. Então, recorrer a quem?
Como neste mês de abril a Igreja Católica irá consolidar a canonização dos três beatos, padre José de Anchieta, João Paulo II e João XXIII, irei apelar com uma petição, dividindo-a em temas para cada um dos novos santos. Iniciando pelo jesuíta José de Anchieta, que esteve bem próximo a nós e encontrou a nossa terra ainda nos primórdios da colonização, com a missão de catequizar os índios, encaminhando-os à doutrina da fé católica. Viveu e sofreu por eles, fundando o Colégio de Piratininga, pedra fundamental da cidade de São Paulo. Pela sua história, entende-se que ele terá possibilidades de atender ao meu pleito. Serei sucinto. Pedirei a interferência nos impostos e na educação, soprando na elite política mais seriedade para esses segmentos de governo, que estão um desastre. A João Paulo II, vitorioso contra as frentes ideológicas, quando papa, que possa reestruturar o Congresso e derrubar a corrupção. E a João XXIII, homem piedoso que trabalhou para as questões sociais, zelar pela saúde do povo, interferindo junto aos dirigentes do País com o fim de tirar a saúde da lama. Clamo também a todos os outros santos para ajudarem o Brasil!
sábado, 5 de abril de 2014
Matéria transfigurada
A matéria de trabalho do artista plástico pernambucano Fernando Ferreira de Araújo é a memória. Ele revive, nessa última fase, a sua trajetória. São experiências em vários setores da vida, transfiguradas. Pictóricas ou não. Como se montasse um impactante jogo. Uma montagem de imagens fragmentadas num entrelaçamento vibrante. Os artistas que perpassaram por suas retinas e seu espírito estão presentes de modo espontâneo, a exemplo de Mark Tobey, Jackson Pollock, Willlem de Kooning, entre outros do expressionismo abstrato, sem os dogmas nem as prisões ao estilo de nenhum deles. A cultura em que mergulhou no seu próprio país e nos Estados Unidos da América — em particular, pelo fato de ter morado numa cidade metropolitana e cosmopolita como Nova York — é um mote natural.
Compreendeu que, acima de tudo, a arte se constitui de trabalho intenso. Só se constrói uma obra com empenho e permanência, parece nos dizer ele através dos gestos pictóricos que adquiriu nesse garimpo da cor e das intrincadas pastas de tintas. Aprumou o seu leme com verve e enfrentou os embates do fazer. Os pincéis foram suas mãos. Tão bem orquestradas que refizeram essas sinfonias da alma. Toques ligeiros e mágicos semelhantes às sonoridades musicais. Como nas cordas das harpas, dos violinos, nos teclados. Pintura é música. É o que se evidencia quando olhamos as pinturas atuais do artista. Ele está mais próximo de si mesmo. Conseguiu codificar uma linguagem plástica que é dele principalmente. É a partir daí que renasce em sua arte e define o seu caminho.
Em princípio, na percepção do espectador, são concepções abstratas que incitam a imaginação a tentar identificar elementos conhecidos da natureza ou coisas elaboradas pelos homens. Às vezes, lembram o espaço com astros e asteroides; outras, mapas ou uma visão de topo das paisagens terrenas, tudo isso são apenas sugestões para leituras em alta velocidade, e é por isso que nós não podemos nos deter em nenhuma dessas interpretações, só há o aspecto do todo. São igualmente signos que estão no mundo secreto do artista. Uma deliciosa mostra por saber que ali estão as digitais de um artista que realiza uma obra que fala do mundo e dos seres, de forma única e onírica.
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