Raul Córdula
Na Galeria Janete Costa, no Parque Dona Lindu, com sua área circular e espaços abertos, o espectador, de qualquer ponto do olhar, vislumbra a obra do múltiplo artista Raul Córdula — que inaugurou a exposição 50 anos de arte, uma antologia —, num equilíbrio entre a arquitetura e o pensamento que emana dos trabalhos do autor.
É uma bela exposição para se olhar e para se pensar, porque em cada série encontramos o alimento para os sentidos, por simplesmente estar presente a plenitude do artista com relação ao percurso que desenvolveu e o prazer de ter marcado uma história construída passo a passo com a coerência de um dos artistas mais presentes na arte e na política cultural do País, admirado e estimado pelos seus pares; e mais ainda para se pensar, porque induz o público a ver além do véu, das aparências, e o faz penetrar no objeto da intenção da obra, educando-o em outra percepção, dando-lhe meios para questionar a arte nas suas amplas interpretações.
Córdula nunca esteve dissociado de um objetivo coletivo: o seu trabalho permanente é ver a arte inserida num contexto social que envolva a comunidade, o artista, o público e todos os que possam circular nesse âmbito. Mesmo nos trabalhos mais recentes, que o artista intitulou Fachada, que tem uma conotação do pensamento estético que tanto o atrai, a geometria, o mote foi uma pesquisa realizada sobre a arquitetura popular do interior e, em uma dessas obras, interpreta a representação de um carro que captou em um grafismo numa das casas no Sertão do Ceará. Na série Paris, de 15 aquarelas, percebe-se a mão do pintor em gestos que estão presentes em outros trabalhos; essas aguadas em pinceladas tênues quebra o rigor das formas geométricas, os triângulos, os círculos, os pontos, numa sinfonia cósmica.
O artista segue em todo o espaço da exposição — com a curadoria competente de Olívia Mindêlo — dialogando com o espectador, mostrando-lhe que a arte transgride certos valores políticos, principalmente nos anos em que éramos proibidos até mesmo de usar metáforas: tudo era subversão, inclusive a inteligência. Na série Araguaia, Raul Córdula denuncia e lembra o trucidamento dos guerrilheiros presentes naquela região. Em outra série, 1968, as obras Primavera Negra 1, 2 e 3 representam mãos que nos apontam armas e foram censuradas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) ao serem expostas no hall dessa instituição. Há ainda O País da Saudade, um trabalho em que Raul estabeleceu correspondência com os artistas enviando um papel em branco com esse título para que cada um deles interferisse na proposta...
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