"A luz na pintura de Palhano é tão vital quanto a fotossíntese no crescimento das plantas, daí por que se distancia de qualquer concepção acadêmica de mera iluminação do cenário. Essa luz invisível preexiste na tela, é embutida no seu cerne, como uma candeia fechada."
Francisco Brennand

domingo, 23 de junho de 2013

O mal em nós

                                          A Escola de Atenas,Rafael Sanzio -1509

A maldade humana é um fenômeno natural. Na essência somos assim: próximos ao mal. Se não fôssemos, não haveria necessidade de existir, na história, tantos filósofos, profetas e iluminados, com a finalidade de nos lembrar do lado ético, despertando-nos os exercícios de bondade e compaixão, como Sócrates, Platão, Krishna, Confúcio, Moisés, Buda, Jesus, Maomé; além das tradições hindus e os exemplos de indivíduos que marcaram a modernidade com a consolidação de ideias avançadas de direitos humanos, de equilíbrio e preservação do planeta.

 É difícil nos reconhecermos dessa forma: como criaturas capazes de praticar o mal. Pretendemos ser reconhecidos, no verniz social, como pessoas do bem, de respeito, espelho, para os outros, de moral e inteligência. Ficamos indignados quando nos colocam uma lente de aumento e mostram o lado podre de nossas ações. Mas apontamos facilmente o dos outros. Estamos também cegos para o sofrimento dos semelhantes, aqueles que representam o “inferno”. E apreciamos os personagens maus, representados na dramaturgia.
 
Em todas as faces da sociedade existem essas sementes do mal, nas religiões, na política, na ciência, na arte, na comunicação... Movemo-nos nessas forças das várias escalas profissionais e dos relacionamentos humanos com um tom de diplomacia que beira, quase sempre, uma franca hipocrisia. Nesse instante, pensamos logo e só nas relações políticas, quando alguns políticos se cumprimentam com as tapinhas nas costas e o sorriso fácil dos acordos mais esdrúxulos. Mas, se aumentarmos o grau de nossas lentes psíquicas, veremos que em muitas dessas relações humanas há tramas de armadilhas.
 
As criaturas humanas que transcendem essa maldade intitulamos como heróis, e estas são perseguidas, pisadas, maltratadas, porque não estão no mesmo patamar do mal, e, depois que as destruímos, pomo-las nos altares da humanidade. E os maus famosos e mais próximos ao nosso século, por exemplo, os que assassinaram grande parte da humanidade, como Hitler, Mussolini, Stalin, Pol Pot e outros, cobrem uma multidão de maus menores, que são homicidas, ladrões, mesquinhos, maledicentes, egoístas, ambiciosos, preconceituosos, invejosos... Com a devida vênia, excelências e eminências, o mal ainda predomina em nós!


 

domingo, 9 de junho de 2013

O legado de Van Gogh

O pintor Vincent Willem van Gogh (1853–1890) nasceu um ano após e no mesmo dia do natimorto Vincent van Gogh, começando assim sua história dramática. O Willem e o Vincent do nome do artista vêm dos dois avôs. Ele era o mais velho dos irmãos Anna Cornelia, Theodorus, Elizabeth, Wellemina e Cornellis Vincent, educados rigidamente sob a orientação protestante calvinista, pelo fato de o pai, Dorus, ser pastor e ter como base o pensamento de Calvino — “Tudo que não é dever é pecado”. A mãe, Anna, fechava o círculo familiar afirmando: “Somos moldados primeiro pela família e depois pelo mundo”. A família holandesa, à época, como a dos Van Gogh, era regida pela santíssima trindade doméstica: o dever, a decência e a solidez.

Van Gogh era uma personalidade diferenciada. Quando tentava se enquadrar na tradição familiar quanto à religião e aos princípios daquele ambiente, era um desastre. O primeiro passo foi trabalhar na galeria de arte do tio Cent van Gogh, um dos parentes, que, ironicamente, enriqueceu com a venda de obras de arte e se associou a outra grande galeria, a Goupil, de um francês chamado Adolphe Goupil, formando o nome Goupil & Cie, que invadiu o mercado de arte europeu. Mas Van Gogh não se adaptou à disciplina de vendas: foi o seu primeiro fracasso.

Depois tentou ser pastor, mas foi reprovado no teste de avaliação para exercer a função. Mesmo assim, foi mandado para a Bélgica, para as minas de carvão, em Borinage. Lá, quis ser o protetor dos explorados operários; seus superiores religiosos o demitiram porque desonrou o padrão de pastor. Então, revoltou-se contra a religião e chamou os seus dirigentes de “sepulcros caiados”, outra derrota. Entre as várias decepções por que o artista passou, houve o rompimento com a família.

A arte levou-o a libertar-se dos venenos que a serpente família inoculava sobre seu espírito. Na verdade, o artista só teve dez anos para realizar a obra genial que é reconhecida pela história. Só um irmão o acompanhou e o ajudou a realizar a sua obra. Foi Theodorus, o Theo das longas cartas, nas quais Vincent compartilhava suas experiências detalhadas como artista.

Na cidade de Arles, no sul da França, o artista expandiu a sua mente realizando obras de maior representação, foi ali que conviveu com Gauguin e onde teve também um final trágico...