O final do século 19 e o início do século 20 foram importantíssimos para o pensamento atual das artes plásticas no mundo. Foi nesse período que se iniciaram os primeiros abalos em sua estrutura quanto à percepção do olhar: foram os tempos das renovações, das rupturas com o academicismo. Os artistas tinham em mente não permanecer nas Academias, porque consideravam um ambiente a caminho da estagnação, onde o interesse se resumia aos temas históricos ou alegóricos, ao estudo da anatomia humana e animal, à representação dos deuses mitológicos gregos e romanos e às paisagens, longe da luz solar. Também porque os acadêmicos não permitiam nenhum desvio das concepções formais desses estudos; e qualquer movimento que propiciasse uma revolução estética estava fora das influências das Academias. Mas os acadêmicos, na verdade, eram os que detinham o poder; e os revolucionários, os desconhecidos e marginalizados.
O Impressionismo é um exemplo de movimento que revolucionou o século 19, abalando aquele mundo acadêmico. Os artistas impressionistas começaram a perceber que a pintura captada ao natural possibilitava infinita diversificação perceptiva das cores, segundo a intensidade e o movimento da luz, que se coadunava, simultaneamente, com as teorias científicas contemporâneas que tratavam da luz e das suas relações ópticas.
A revolução plástica permaneceu, a partir do Impressionismo, à margem das Academias. Os artistas estavam motivados a olhar o mundo através de outros caminhos. Picasso, que foi uma das genialidades do século 20, saiu da Academia espanhola para enfrentar uma nova realidade em Paris. Foi ali que percebeu, com a sua agudeza, o universo dos pós-impressionistas e, principalmente, a excepcional visão de Cézanne (artista alijado do academicismo), que revolucionou a perspectiva linear do Renascimento como uma aspiração à solidez, possibilitando uma real estrutura das coisas em um rigor geométrico no espaço pictórico. Daí surgiu o Cubismo, que envolveu Braque, Picasso e uma leva de artistas importantes, numa intensa elaboração de obras cubistas que se espalharam sobre o continente europeu.
Também, anteriormente, os artistas Matisse, Derain e Vlaminck, que lideravam um movimento, distantes das Academias e influenciados pelas cores fortes de Van Gogh, Gauguin e ainda Cézanne, elaboraram um novo processo de captação plástica com total liberdade e foram denominados, pejorativamente, de fauves (feras), de onde nasceu o termo Fauvismo, paralelo ao Expressionismo alemão. E todos os outros movimentos do século 20 surgiram por força dessas individualidades geniais que se uniam a outras personalidades para concretizar ideias, mas sem o respaldo do academicismo tradicional.
Mas, no nosso tempo, após um longo período de descrédito, as Academias passam a ter o mesmo papel em relação ao poder e ao dogmatismo das velhas instituições do século 19, com uma diferença: incorporaram, nos seus métodos de ensino, os pensadores do século 20, identificados com as ideias dominantes e oficiais, da arte. Para pensar arte naquele ambiente, antes tem que passar por esses filósofos, e qualquer desvio dessa meta será entendido como uma subversão. Isso é louvável como conhecimento, mas não como afirmação dogmatista do que é ou não arte. Seria possível imaginar, hoje, uma inteligência como a de Picasso ou de outros artistas passando pelos testes de avaliação filosófica dos seus contemporâneos, quando eles próprios diziam o que era arte? Será possível delimitar conceitos em que se nega qualquer outro pensamento que não seja os considerados universais pelas Academias? Estas voltaram ao mesmo rigor petrificado e único para formar domesticados multiplicadores de ideias congeladas que pouco dizem da arte.
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