"A luz na pintura de Palhano é tão vital quanto a fotossíntese no crescimento das plantas, daí por que se distancia de qualquer concepção acadêmica de mera iluminação do cenário. Essa luz invisível preexiste na tela, é embutida no seu cerne, como uma candeia fechada."
Francisco Brennand

quinta-feira, 15 de março de 2012

Michelangelo e Lourenço, o Magnífico

Foi no jardim de Lourenço de Medici, o Magnífico (1449–1492), “príncipe sem coroa de Florença”, que Michelangelo, aos quinze anos, o conheceu: uma das personalidades mais importantes do século XV, estadista e diplomata, soberano de fato da República Florentina no Renascimento italiano, patrono de pintores, escultores, arquitetos, poetas, filósofos e pensadores políticos, que o buscavam como grande mecenas e homem da cultura.

Michelangelo esculpia uma cópia da cabeça de um fauno antiga, e il patrono ficou impressionado com a inteligência e habilidade daquele garoto, que ainda estava recebendo a sua formação do escultor Bertoldo di Giovanni — que montou ateliê entre as sombras das árvores do jardim — após ter saído do ateliê do famoso pintor Domenico Ghirlandaio, onde aprendeu o ofício da pintura em suas várias técnicas, mas pensando sempre em esculpir. Naquele jardim, Michelangelo começou a estudar as esculturas greco-romanas colecionadas pelo Magnífico Lourenço, inebriando-se com a beleza e o paradisíaco estúdio ao ar livre.

O jardim, denominado Hortus Laurentii de Medicis, adornado de ciprestes, pinheiros e imagens clássicas, foi centro de atenções e presenças de arquitetos, pintores e escultores que fizeram história no Renascimento; entre eles, em épocas diferentes, Andrea del Verrocchio e Leonardo da Vinci; este último, discípulo de Verrocchio, conviveu, em sua juventude, com a corte dos Medici, no palácio Via Larga, e recebeu as melhores influências, como os que viria depois usufruir, Michelangelo Buonarroti, um artista bem mais jovem.

Ao observar o fauno que Michelangelo havia terminado, Lourenço disse-lhe em tom paternal que a escultura parecia-lhe mais um jovem romano que um sátiro. O artista, então, trabalhou a peça retirando um dente e perfurando a gengiva, aperfeiçoando a ideia de um fauno; esperou no dia seguinte que Lourenço visse aquela representação, e, logo que o Magnífico a viu, interessou-se pelo jovem escultor e o admitiu em seu palácio, permitindo-lhe conviver com a cultura provinda dos seus habituais filósofos, poetas, artistas, arquitetos, políticos e todo o refinamento da corte, oferecendo-lhe instalações para que convivesse com os seus filhos e partilhasse a sua mesa, que, a época, era uma verdadeira distinção. Para Michelangelo, foram os mais felizes anos de sua tumultuada vida de artista independente e rebelde até mesmo ante o poder pontifício do extraordinário papa guerreiro Júlio II.

No palácio Via Larga, encontrou não somente a proteção primordial do Magnífico, como recebia as melhores orientações do escultor Bertoldo, que era responsável pela coleção dos objetos preciosos de Lourenço, além de gozar de sua amizade pessoal, era uma espécie de assessor para assuntos das belas artes no palácio. Também Angelo Poliziano — poeta e um dos pensadores admitidos pela corte dos Medici — exerceu uma forte influência sobre Michelangelo, sugerindo assuntos literários para os trabalhos em escultura, como no relevo Batalha dos Centauros, tema mitológico inspirado pelo poeta. Ali, o escultor formou a sua base para perpetuar o seu gênio em obras-primas que exerceram uma forte permanência no imaginário da humanidade, principalmente em nossos tempos decadentes.

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