"A luz na pintura de Palhano é tão vital quanto a fotossíntese no crescimento das plantas, daí por que se distancia de qualquer concepção acadêmica de mera iluminação do cenário. Essa luz invisível preexiste na tela, é embutida no seu cerne, como uma candeia fechada."
Francisco Brennand

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O mercado de arte regional

Ao se esmiuçar o mercado promissor de arte no Nordeste, constatam-se aqueles que estão na liderança ou no olho do furacão: uma elite financeira, os que giram em órbita e usufruem do potencial desse circuito, e os artistas envolvidos no sistema, em várias gradações. Apesar de percebermos aqui, no Recife, um movimento positivo em torno de galerias, marchands e artistas, há muitas perguntas que podem ser feitas. Por exemplo: existe, de fato, um mercado consolidado, a exemplo dos países desenvolvidos, onde os preços e as obras dos artistas são avaliados por um processo que inclui as referências históricas, a invenção do autor, a influência estética sobre o seu tempo, etc.?

Quando pensamos em mercado de arte no mundo, voltamos o olhar a personagens importantes do século XX, que o dinamizaram com suas iniciativas marcantes. A começar por Peggy Guggenheim (1898-1979), que se tornou uma das maiores colecionadoras das obras dos artistas de sua época e os colocou no topo do mercado, como Jackson Pollock, Max Ernst, Wasili Kandinsky, Paul Klee e muitos outros; a sua iniciativa foi precursora de toda essa força que está hoje nas grandes sucursais da fundação Salomon R. Guggenheim. Filha de milionários norte-americanos, Peggy se empenhou em gastar seus milhares de dólares, com inteligência, em artistas promissores.

Outra personalidade, Georges Wildenstein (1892–1963), marchand francês que herdou do pai, Nathan, a tradicional Galeria Wildenstein, tornou-se um dos veículos mais dinâmicos no mercado de arte para a circulação das obras impressionistas e pós-impressionistas entre os colecionadores, principalmente norte-americanos, e deixou um lastro como um marchand essencialmente consciente da cultura e dos valores espirituais da arte.

Essas são algumas das referências que nós, nordestinos, procuramos imitar mantendo as características próprias, claro, com uma história particular. Aqui, no Recife, os comerciantes tradicionais mantiveram-se desde a década de 1960 e, ao longo do tempo, foram se aperfeiçoando, criando formas novas de adaptar o mercado à atualidade. Hoje, praticamente só a elite econômica procura obra de arte com preços razoáveis nas galerias; essa é uma realidade concreta. Na década de 1970, predominava a classe média, formada por profissionais liberais ou funcionários públicos, que conseguia adquirir obras através de consórcios ou de bons parcelamentos. Os proprietários que permaneceram no mercado consolidaram seus nomes e os estabelecimentos com sacrifícios, partindo de um ponto a outro, a passos lentos. Mas quem pretende iniciar nessa atividade terá que ter segurança financeira para poder bancar os riscos e os investimentos naturais; geralmente, estes são também provenientes da elite econômica.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

O artista e o seu tempo

Naturalmente, o nosso mundo vive o ápice do conhecimento científico, tecnológico, e isso influencia todas as demais áreas do pensamento humano. Nem o Manifesto Futurista, em 1909, do poeta Marinetti, que exaltava “a beleza da velocidade”, como “um automóvel rugidor”, o “voo rasante dos aviões”, a “guerra ― única higiene do mundo”, imaginava a quanto chegaríamos: ao domínio das terras, dos mares, dos ares, deste planeta; e, fora dele, nessa inimaginável velocidade, alcançando e explorando o seu satélite, enviando sondas espaciais para saber de outras explosões criativas de mundos e nebulosas, penetrando no universo ínfimo dos átomos, desenvolvendo a nanotecnologia, revelando, assim, uma nova etapa da humanidade muitíssimo mais veloz do que a era do Cubismo, Expressionismo, Fauvismo e de todos os movimentos do início do século XX, inclusive do manifesto italiano, que influenciou o Modernismo brasileiro.

O artista de agora recebe esse impacto contemporâneo com agudeza em seu espírito e tem à disposição não somente todos os meios materiais e virtuais para dar vazão ao ato criador, como também as informações, que são múltiplas e intensas, advindas de conferências, livros, revistas, jornais, etc. Os meios materiais são as novas tecnologias em computação, em vídeo; são os veículos técnicos para as expressões plásticas, como tintas e outros. Essa revolução em processo – uma rede incomensurável de circuitos concretos para a criação – seria, no mínimo, estarrecedor para a cabeça daquele modernista ou de um renascentista que preparava todos os seus materiais. Nós, que recebemos todos esses recursos em mãos, não compreendemos o que significa preparar uma cor, uma tela ou um trabalho manual que exija mais habilidade ― o que, aliás, não está em voga em certas conferências.

Mesmo o artista vivendo o seu tempo, o que permanece é o pensamento individual, a elaboração da arte que escolheu e o caminho estético para desenvolvê-la; não se pode negar que o criador ou inventor tem o poder de selecionar as suas escolhas e discuti-las e, principalmente, de refugiar-se das ideias construídas em rebanho, extremamente nocivas, onde “todos turvam as suas águas para parecerem profundas” e poucos se atrevem a discordar do coletivo. Essas ideias estão difundidas em alguns setores da cultura, do poder político e do financeiro, que dão o aval em troca da publicidade.