"A luz na pintura de Palhano é tão vital quanto a fotossíntese no crescimento das plantas, daí por que se distancia de qualquer concepção acadêmica de mera iluminação do cenário. Essa luz invisível preexiste na tela, é embutida no seu cerne, como uma candeia fechada."
Francisco Brennand

quarta-feira, 20 de abril de 2016

Chagall e a Revolução Russa

                                                                                Marc Chagall

Deflagrada a Revolução de 1917, o pintor russo Marc Chagall, imbuído de idealismo, retorna à sua pequena aldeia natal, Vitebsk, de população predominantemente judia — ele próprio era judeu —, já com um percurso considerável em Paris, onde conheceu a vanguarda de artistas plásticos e poetas. Amigo de Modigliani e do poeta Apollinaire, que selecionou obras do artista para realizar uma exposição em Berlim, associa-se à Escola de Arte do Povo de Vitebsk, fundada em 28 de janeiro de 1919, no calor da influência revolucionária, como um dos professores mais importantes e colaboradores educacionais da arte no movimento bolchevista.

Chagall alcançou um prestígio notável com os estudantes e a população local, atraindo todos os interessados em estudos da arte com as inovadoras interpretações das coisas a serem representadas. Em aulas de campo, por exemplo, ensinava que seria interessante captar a natureza pelo seu lado mais feio para, então, retirar dali o belo e a essência. Pregava uma arte livre, individualista e independente, que ia de encontro, naturalmente, ao coletivismo das novas ideias da ordem marxista/leninista vigente.

Seu interesse era o povo, e acreditava que a educação pela arte seria um meio libertador. Dizia que era preciso “cuidar para não apagar as peculiaridades individuais de cada pessoa, embora trabalhando em grupo”. Por isso, o seu ensino era chamado de “estúdio livre”, tinha o maior número de inscritos. O seu estilo marcou, entre seus alunos, pela admiração e pelo respeito às ideias e à obra.  Ele se entusiasmava em ver uma população pobre, jovem, de origem operária, interessada em se integrar à Escola de Arte, criando uma nova perspectiva de vida e de alegria. O artista recrutou, em Petrogrado e Moscou, professores como o futurista Ivan Puni e a esposa, Ksenia Boguslavskay, entre outros, para a empreitada educativa na arte.

Mas o entusiasmo de Chagall foi arrefecendo com as lutas internas revolucionárias e estéticas de alguns, que pretendiam provar qual arte estaria destinada a representar melhor a nova revolução. Um deles foi Malevich, que criou o suprematismo, acreditando ser o mais puro símbolo do coletivismo na arte bolchevista; e o seu discípulo direto, Lissitzky, que não aprovava o ensino do pintor de Vitebsk. Logo Malevich entrou em choque com o humanismo de Chagall, que se ausentou de Vitebsk e da Rússia e voltou a Paris. Esse momento significou o início do conturbado fim da Escola de Arte do Povo, que após também o afastamento dos suprematistas, aos poucos se destruiu. Mas existia outro grupo na arte da revolução bolchevista: era o dos que achavam que o realismo seria o caminho. O mau gosto predominou: o território russo encheu-se de esculturas de Marx, de Lenin, de Stalin e de corpos musculosos.