"A luz na pintura de Palhano é tão vital quanto a fotossíntese no crescimento das plantas, daí por que se distancia de qualquer concepção acadêmica de mera iluminação do cenário. Essa luz invisível preexiste na tela, é embutida no seu cerne, como uma candeia fechada."
Francisco Brennand

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

O Judas de Da Vinci

                                                              Judas - Leonardo da Vinci

Sabe-se que Leonardo da Vinci tinha um temperamento, como pintor, que o induzia a trabalhar com vagarosidade, na concepção, nos desenhos preparatórios, nas pinceladas, com camadas de tinta inferiores finas, a ponto de algumas vezes abandonar obras que permaneceram inacabadas. A pintura a óleo ― uma novidade no século XV, atribuída ao flamengo Jan van Eyck (c. 1390–1441) ― era a mais adaptada para o processo de elaboração pictórica do artista. E às vezes utilizava uma técnica mista, com têmpera. Quando partiu de Florença ― sua terra natal, que lhe deu a formação necessária no ateliê de Andrea del Verrocchio para se tornar um mestre ―, foi para Milão e se aproximou do duque Ludovico Sforza, o Mouro, o senhor da capital da Lombardia. Ofereceu-lhe, numa carta de apresentação, primeiro as suas habilidades inventivas na engenharia, na arquitetura e nos projetos de armas bélicas e, por último, na música, na pintura e na escultura. Apesar de Ludovico se interessar mais por outras engenhosidades, como as militares, e ainda dar-lhe tarefas variadas, fez-lhe uma encomenda para ser realizado o mural A Última Ceia, no refeitório da Santa Maria delle Grazie, em Milão, igreja e convento dos dominicanos. A pintura, a têmpera, ficaria na parte central, mais alta e iluminada do ambiente.


Leonardo faz as anotações, por escrito, do drama da Ceia, em que Cristo diz: “um dentre vós me trairá...” (Mt 26.21). Concebeu o estudo de cada apóstolo, de como seriam representados na reação à premonição do Mestre. Como se movimentariam em conjunto, ressaltando suas particularidades psicológicas. Para melhor retratar os apóstolos, desenhava pessoas que pudessem representá-los. Há alguns testemunhos de que, quando trabalhava na obra, o mergulho era tanto que se esquecia de se alimentar. Deixou o Cristo e o Judas por último. E nessa fase ia diariamente observar o mural para estudar como decidiria pintá-los. O prior dos dominicanos foi se queixar a Ludovico que o artista só estava contemplando a obra e não trabalhava, pedindo-lhe que falasse com o pintor para que a finalizasse. Da Vinci foi chamado à presença do duque de Milão e do prior. Leonardo explicou que estava num momento muito delicado, porque procurava modelos que pudessem representar os dois personagens, mas que, ali, já tinha encontrado quem iria representar Judas: o próprio prior. O duque deu gargalhadas.

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